Em 1999 dois estudiosos da Universidade de Cornell (EUA) descobriram um "buraco de coelho" no campo da epistemologia:
Eles observaram que quanto menos você sabe sobre um assunto, mais você julga saber sobre ele.
Os nomes desses estudiosos são David Dunning e Justin Kruger.
Pense só nisso: quanto menos você sabe, mais você acha que sabe! Quanto menos consciência você tem, mais certo você fica de que está consciente.
Não é uma constatação fascinante e … ao mesmo tempo, contra-intuitiva? Não deveria ser o contrário?
para essa pessoa [sob o efeito Dunning-Kruger], o assunto é tão simples e razo quanto o nível de consciência que ela tem sobre ele. É o mal de tomar os limites do próprio conhecimento como medida para a realidade em si.
Antes de responder isso, imagine alguns cenários comuns do dia-a-dia:
• Um jovem se manifestando nas redes sociais e emitindo suas críticas ferrenhas sobre o conflito Israel X Palestina;
• Uma jovem destilando suas opiniões sobre as políticas migratórias da União Européia;
• Outra pessoa escrevendo sobre as premissas adotadas para os vetores econômicos norte-americanos;
• E outra pessoa pretendendo educar seus concidadãos pela mídia social sobre práticas de segurança pública.
São cenas comuns do cotidiano, não são?
Mas você já parou pra pensar que em todos esses casos, o denominador comum é uma reverberação de opiniões que se julgam elaboradas e "autênticas", mas que apenas ecoam frases e fragmentos de informação que foram ouvidos em outros lugares?
Mais de 99% das pessoas que emitem julgamentos sobre situações como essas nunca estudaram a fundo as questões e problemas envolvidos. Nunca buscaram argumentos de ambos os lados, em uma disposição dialética. Na verdade, a maioria sequer estudou qualquer coisa pra emitir uma opinião.
Mas todos estão convictos de que sabem muito sobre determinado tópico.
Esses são apenas exemplos extraídos do cotidiano pra mostrar uma verdade:
Você não sabe o que você não sabe!
Este é o efeito Dunning-Kruger.
Por que existe esse efeito?
Porque quando uma pessoa não sabe muito sobre um assunto, ou não sabe qualquer coisa sobre ele, ela também não conhece as problemáticas envolvidas. Ela não conhece a profundidade das questões que envolvem esse conhecimento e, portanto, para essa pessoa, o assunto é tão simples e razo quanto o nível de consciência que ela tem sobre ele. É o mal de tomar os limites do próprio conhecimento como medida para a realidade em si. É ser tão ignorante sobre alguma coisa que sequer se sabe que é ignorante. É o estágio da incompetência inconsciente, no ciclo do desenvolvimento de competências, no qual a pessoa sequer sabe que não sabe.
Mas pra que isso serve no contexto da gestão de pessoas?
Considerações do efeito Dunning-Kruger em contextos relevantes
Pense no efeito Dunning-Kruger na próxima vez que você for:
- Se autoavaliar - cuidado para não cair na rede do efeito Dunning-Kruger e achar que é nota dez em todos os pontos (não por ser realmente nota dez, mas por ser tão incompetente nesses pontos que sequer sabe que é incompetente).
- Avaliar um membro do time - a não ser que você tenha estudado muito e por anos o seu campo de atuação, e continue estudando e aprendendo coisas novas, você pode cair no erro de avaliar um colega considerando pouco ou nada sobre o campo de atuação dele, mas simplesmente tomando o que você sabe como a realidade em si.
- Elaborar um PDI (Plano de Desenvolvimento Individual) - certifique-se de que você não está sob o efeito Dunning-Kruger na hora de escolher quais frentes de desenvolvimento irá perseguir, pois muitas vezes você pode estar cego justamente para aquelas frentes que julga estar bom.
- Ofertar um feedback para um colaborador que julga ser superior aos outros, mas que está entregando resultados fracos - leve em consideração o Dunning-Kruger para realizar este feedback, pois apenas dizer ao funcionário que ele não está indo bem não o convencerá e o colocará na defensiva. Busque cercá-lo com alguns problemas mais complexos das competências em questão por meio de perguntas que instiguem a reflexão dele e lancem luz sobre uma profundidade um pouco maior dos problemas.
- Buscar parcerias com gestores para facilitar a consecução dos seus projetos, julgando inadvertidamente que todos compraram suas ideias.
- Supor que seu time está feliz e engajado junto com você - o Dunning-Kruger pode estar ainda mais presente nessa situação caso você tenha alguma experiência com gestão de pessoas ou seja um gerente de RH, pois você provavelmente irá supor que sua expertise com pessoas te torna imune a cometer erros básicos gerenciando sua própria equipe. Você pode ter uma grande surpresa em algum momento.
Todos nós somos sujeitos a cair no efeito Dunning-Kruger, em algum ponto, em diferentes momentos de nossas vidas. A melhor forma de evitar isso é:
- Estudar sempre e manter uma consciência de aprendiz ao longo da vida;
- Rever posições e opiniões periodicamente;
- Treinar a autoconsciência para identificar viéses de opiniões e distorções cognitivas;
- Inciar um processo de coaching, para desenvolver autoconsciência e autoconhecimento;
- Praticar a empatia;
- Adotar uma inclinação dialética nos estudos.
Paulo é apaixonado por aprendizagem e atua como mentor de trainers e profissionais da educação corporativa. É também speaker e articulista sobre educação adulta, autodesenvolvimento, liderança e habilidades comportamentais. Possui especialização em andragogia e design instrucional. Como people enabler de orientação humanista, além de trabalhar em projetos de aprendizagem organizacional, atua individualmente com pessoas em processos de coaching. Compartilhe este artigo no LinkedIn e em suas redes pelos botões abaixo!